LIÇÕES QUE PRECISAM SER ESCLARECIDAS EM MUITAS DE SALA DE AULA

Foto do autor. Cordilheira dos Andes, 4.320 m de altitude. Próximo dos Geiseres El Tatio. 
Norte do Chile - setembro de 2023

Aguimon Alves, 12/12/2023


 Introdução

Há duas grandes razões para justificar remunerações mais elevadas no âmbito das carreiras jurídicas do serviço público, tais como a magistratura e o ministério público: a) para atrair os melhores profissionais; b) para diminuir a possibilidade de corrupção. São carreiras muito concorridas e por isso atraem os melhores profissionais que buscam remunerações dignas, além de terem independência e estabilidade no trabalho, características que também podem funcionar como barreiras contra a corrupção. Embora seja fato que a integridade no serviço público tenha mais a ver com valores éticos, não se pode descartar os vícios de todos os tipos que desencaminham o indivíduo de suas atribuições, inclusive de quem recebe as maiores remunerações.

Considerando a lógica do parágrafo anterior, seria possível afirmar que a baixa remuneração dos professores do ensino básico seria um convite a algum tipo de vício? Não me refiro ao vício do crime de corrupção propriamente dito, mas a um tipo de conduta profissional que faz do magistério uma plataforma de disseminação do ideário neomarxista ou de qualquer outra corrente doutrinária que desvia a finalidade da escola. Em outros termos, refiro-me ao docente que enxerga sua atuação em sala de aula mais como um ativismo político-ideológico do que o exercício profissional no ensino da matemática, da língua portuguesa, da história dentre outras disciplinas. Inúmeros professores alegam que estão formando cidadãos, mas parece que não se dão conta de que a cidadania não se constrói com má formação escolar e/ou dependência econômica do indivíduo.

Certamente muitos professores não vislumbram algum grau de ativismo político-partidário em suas atividades profissionais, sendo uns mais discretos, outros mais agressivos. Não sabem que são prisioneiros do pensamento único desde o ensino básico. Foram acostumados a não questionarem determinadas teorias verbalizadas pelos especialistas. Foram moldados para serem refratários ao modelo de sociedade baseado na economia de mercado, embora desconheçam os seus mecanismos de funcionamento. Não percebem que são refratários porque são como peixes que não enxergam a água, pois sempre viveram nela.

Mas qual a origem de muitos professores acharem que têm uma missão político-partidária em sala de aula? Primeiramente preciso retornar ao passado para contextualizar o presente.

A revisão do marxismo

Marx (1818-1883) analisou o mundo de sua época sob a ótica de uma luta de classes: os burgueses explorando os proletários. Visão simplista de uma sociedade que já era altamente complexa na época do teórico. A solução para acabar com esta exploração seria a implantação da ditadura do proletariado a fim de eliminar a propriedade privada e, consequentemente, as diferenças entre as classes. E isto seria uma questão de tempo nos países com graus mais adiantados de industrialização. Os trabalhadores explorados tomariam pela violência os meios de produção e implantariam um estado controlador e distribuidor das riquezas até atingir o comunismo. Mas quem controlaria este estado? Quem decidiria que a sociedade ideal é o estado controlando tudo?

A revolução profetizada por Marx não aconteceu em um país com adiantado grau de industrialização. Ocorreu na Rússia em 1917 onde ainda existia uma estrutura econômica nos moldes absolutistas que impedia a concretização de um dinâmico parque industrial. Este atraso econômico contribuiu para o processo revolucionário liderado por Lenin. A fase do capitalismo vivenciada por Marx era apenas uma etapa e não algo a permanecer para sempre, pois a evolução das tecnologias é o verdadeiro motor das mudanças sociais e não as revoluções de bases marxistas.

O filósofo Antonio Gramsci (1891-1937), fundador do partido comunista italiano, percebeu a impossibilidade de uma revolução socialista em países adiantados industrialmente, por isso propôs a revisão da teoria de Marx, mas sem perder a essência do teórico. Em outros termos, nos países mais industrializados da Europa Ocidental e também nos Estados Unidos, o capitalismo já tinha iniciado a fase distributivista naquela primeira metade do século XX. O proletário e o pequeno empreendedor perceberam as oportunidades de melhorarem de vida sob a égide da economia de mercado. Jamais o operariado iria pegar em armas para atender o chamado de uma elite socialista que, por meio do estado, prometia um mundo sem os capitalistas. Tudo não passava de uma busca pelo poder a qualquer custo. Por isso, não adiantava tentar uma revolução naqueles países nos moldes daquela que aconteceu na Rússia em 1917, com muita violência e extermínio de qualquer pessoa que discordasse dos iluminados bolcheviques.

 Diante desta realidade, Gramsci engendrou a revolução cultural, ou seja, desconstruindo uma superestrutura baseada nos valores judaico-cristãos e seu modelo de família, o sentido da propriedade privada, o direito romano-germânico, as artes e os costumes em geral. Tão logo essa desconstrução alcançasse os objetivos, seria uma questão de tempo a apropriação da infraestrutura (os meios de produção). Nesta fase, o estado já seria o grande controlador e quem controlasse o estado controlaria toda a sociedade.

Entendia o filósofo que a sustentação do capitalismo era de natureza cultural. Não adiantava pegar em armas, mas sim mudar as mentalidades para que as pessoas aceitassem naturalmente uma nova ordem socioeconômica. Era necessário que um partido político determinasse uma vontade coletiva para que todos tivessem como referência o mesmo pensamento e caberia aos intelectuais orgânicos criarem a vontade coletiva.

De fato, a melhor forma de dominar não é por meio das armas, mas pela cultura, processo demorado porque implica em intenso trabalho de desconstrução e concomitante substituição dos valores culturais, subvertendo-se a religião (especialmente o cristianismo), os costumes, o direito, as artes e tudo que possa ser visto como pilar de sustentação do capitalismo. Os agentes eleitos para esta tarefa foram os professores, os intelectuais (escritores), os jornalistas e os artistas. Os dois primeiros representam a base para formar as novas gerações e os dois últimos são os disseminadores do pensamento dos teóricos de linha marxista. Conquistando-se esses profissionais que lidam com o conhecimento, as teorias, a informação e o entretenimento, o sucesso estaria garantido.

A empreitada teórica sintetizada acima avançou bastante na construção de uma vontade coletiva. O mundo não poderia ser resumido na simplista relação dicotômica entre burguês e operário. Todas as dimensões sociais deveriam ser exploradas exaustivamente como problemas gerados pela sociedade capitalista.

A partir da formação de um novo grupo social, dotado de uma só vontade coletiva e tudo sob o controle teórico dos intelectuais, já seria possível contemplar o grupo dirigente antes mesmo deste grupo conquistar o poder político. Na verdade, é mais importante manter o monopólio intelectual e cooptar várias camadas das classes intelectuais, inclusive dos grupos adversários, do que primeiramente tentar assumir o poder político. Ocorrendo tal situação, significa que já existe a chamada hegemonia, que é constituída por um bloco ideológico capaz de manter o monopólio dos agentes disseminadores de um novo paradigma marxista.

A teorização da ideia de hegemonia no âmbito do gramscismo responde à crise do marxismo. Por isso que, após Gramsci, surgiram inúmeros teóricos neomarxistas que povoaram as universidades do mundo democrático. Viviam às custas de um modelo econômico de liberdade, não para falar bem, mas para teorizar sobre os males do próprio sistema que os tornaram famosos.  

  Não era possível adequar a teoria da unidade universal das classes operárias às transformações sociais promovidas pelo capitalismo concorrencial. Seria importante identificar e instrumentalizar outros conflitos sociais além da tal luta de classes entre burgueses X operários. Daí a necessidade de se criar novas lutas de classes, mas em outras dimensões sociais, a fim de explorar exaustivamente os seus conflitos. Família, etnia, religião, homossexualismo, drogas, meio ambiente etc., são importantes ativos ideológicos invocados pelos chamados progressistas.

As palavras “progressista” e “progressismo” vem substituindo os termos “socialista/comunista” e “socialismo/comunismo”, porque a palavra em si remete a algo positivo. Entretanto, mudar a nomenclatura das coisas não muda a raiz do pensamento. É apenas um truque linguístico para atrair as novas gerações. O nome oficial da Coreia do Norte é República Popular Democrática da Coreia. Por acaso a palavra “democrática” mudou a realidade totalitária daquele país?  

O leitor poderia comentar e perguntar: realmente existem inúmeros movimentos alegando defender o meio ambiente, os direitos das mulheres, dos homossexuais, dos negros, e por aí vai. E esses movimentos não surgem do nada. Mas, quem organiza e financia tantos movimentos reivindicatórios e qual o interesse? Seria o próprio capitalismo monopolista, ou seja, os grandes capitalistas que não gostam da saudável concorrência? O fim da concorrência não seria algo que depende previamente da formação de um pensamento único? O acúmulo de capital é tão gigantesco que já não parece mais divertido ganhar dinheiro na concorrência. Ter o controle da mudança de comportamentos é uma obsessão que supera todos os vícios. 

Há muitos inocentes pensando que estão lutando por liberdades e defendendo o multiculturalismo. Apenas fazem parte de um grande coletivo que ostenta rótulos onde se lê democracia, liberdade, multiculturalismo e direitos. O coletivismo é um instrumento para assentar as bases do pensamento único cujo conteúdo se esconde por trás desses rótulos. Se as pessoas perguntassem de onde vem o dinheiro que sustentaram as grandes revoluções sociais e agora sustentam os movimentos ambientais e identitários, talvez não existissem tantos inocentes. Por exemplo: quem financiou a Revolução Russa em 1917? De onde veio o dinheiro para sustentar os cabeças da revolução e a formação de um exército? As perguntas são mais importantes do que as respostas. Quem não pergunta, recebe uma resposta pronta para ser seguida.

A criação de novas lutas de classes

Muitos docentes justificam seu ativismo político-partidário em sala de aula dizendo que na vida tudo é política. De fato, a política pode servir para libertar, como também serve para escravizar. Entretanto, quando alguma coisa pode ser tudo, significa que tal coisa foi totalmente descaracterizada do seu real significado. Não se sabe o que é. Na verdade, quando um conceito é esticado demais, o que se pretende é justamente descaracterizá-lo. E é por isso que, quando muitos professores dizem que tudo na vida é política, a expressão serve como um truque linguístico para apresentar apenas uma corrente doutrinária de organização social. Se cada professor usar parte do tempo de sua disciplina a pretexto de formar cidadãos porque tudo na vida é política, só resta esperar no futuro o efeito contrário. Não há cidadãos sem o aprendizado mínimo necessário para que o indivíduo ganhe seu próprio sustento sem depender do estado.

O ativismo político-partidário em sala de aula, trabalho de formiguinha ao longo de décadas, viabilizou a propaganda de um novo marxismo, ocultando-se o modelo violento imposto na então União Soviética, dentre outros países. Nem mesmo a queda do muro de Berlim (1989) levantou a mínima suspeita de que no Brasil defendia-se a mesma raiz ideológica rejeitada por vários países do leste europeu que sofreram com as ditaduras dos partidos comunistas. E isto se deve ao trabalho anterior a 1989 feito pelas classes dos professores, jornalistas, artistas e intelectuais orgânicos, geralmente escritores com cargos de professores em universidades públicas.

Era necessário aumentar o contingente de ativistas que lutaria pela causa da igualdade de classes, mas sob outra ótica, a do neomarxismo, corrente doutrinária que revisou a luta de classes nos moldes burgueses X proletários. Desta forma, criou-se inúmeras bandeiras identitárias para sequestrar as causas nobres e esconder as intenções primárias. Era preciso desestabilizar os modelos sociais existentes com acusações de darem sustentação ao perverso capitalismo. A ordem é sempre destruir, e não aperfeiçoar as regras sociais porventura descontextualizadas de seu tempo. De fato, foi uma estratégia inteligente. É por isso que foram criadas inúmeras lutas de classes: brancos X negros, héteros X homossexuais, homens X mulheres, policial X criminoso, produtor rural X sem-terra, cristãos/judeus X muçulmanos, magro X gordo, professores X alunos, ambientalista X não ambientalista, ou seja, onde for possível identificar um oprimido, cria-se uma luta de classes para gerar conflitos e divisões na sociedade. Notem que o mundo virou uma grande dicotomia. Para cada mazela social inventa-se o grupo responsável pela sua existência. Sem querer partir para o sarcasmo, já existe até uma luta de classes entre a vogal “o” e a vogal “a”. É a tal linguagem neutra que se pretende impor à língua portuguesa sob o pretexto de torná-la inclusiva. Mas isto é assunto para outro texto que você também pode ler neste blog.

É fato a existência de mazelas sociais que merecem ser combatidas. Entretanto, só um desinformado não consegue enxergar a instrumentalização dos problemas como meio para se alcançar o poder político. Por exemplo, quando ocorre uma agressão a um homossexual, a conduta ilícita do agressor não é individualizada por si só, mas é linguisticamente caracterizada como a conduta de um heterossexual. Muitos jornalistas, escritores, artistas e professores em geral trabalham com uma espécie “marketing linguístico” para desgastar a classe que é identificada pejorativamente como opressora. A conduta ilícita deve ser individualizada e não classificada como uma conduta de classe.

A ideia é subverter por meio das bandeiras identitárias e ambientais, as bases que dariam sustentação ao modo de produção capitalista concorrencial. E elas são fortes no magistério (no ensino básico, principalmente). São fortes porque grande parte dos professores ao cursarem as licenciaturas incorporam o dogma do ódio ao capitalismo. Também são vítimas da manipulação da linguagem numa idade promissora para se converterem a uma causa. Muitos saem das faculdades acreditando numa missão ideológica sob a ótica da luta de classes, agora dentro de uma lógica identitária.

Quando falo do ambientalismo refiro-me à instrumentalização ideológica do tema. Certamente muitos não entendem que as mudanças climáticas sempre ocorreram desde o nascimento do planeta Terra. Elas não existem por causa do capitalismo. Ironicamente, foi este modelo de organização socioeconômica que possibilitou a sobrevivência dos povos independentemente do clima de seu território. Tudo graças à invenção de meios de transportes que facilitaram as trocas comerciais. Noruegueses podem comer frutas tropicais e carne bovina sem produzirem esses produtos. Alemães podem aquecer suas residências às custas do petróleo e do gás de terras muito distantes e assim por diante.

Em tempos remotos, morrer de frio ou de fome por causa das secas e de invernos rigorosos era determinismo geográfico. Hoje é mais um determinismo político do que uma hostilidade da natureza. O uso ideológico do ambiente encobre os problemas ambientais cujas soluções estão ao alcance da humanidade e beneficiariam as populações vulneráveis. Por exemplo, parece-me que não tem importância política nas agendas dos formadores de opinião o problema da falta de saneamento básico, mas criticam de forma hostil a produção de carne bovina como um dos fatores responsáveis por um tal aquecimento global. Muitas celebridades que se dizem preocupadas com a preservação da cultura dos povos indígenas e pregam a conservação dos costumes de seus ancestrais, consciente ou inconscientemente, defendem a preservação de riquezas sobre e sob territórios importantes para o futuro de nações que já exauriram seus recursos. Os indígenas não têm direito a uma agricultura mecanizada e energia elétrica?   

Concomitante às novas lutas de classe também é importante construir o pânico. Na década de 1970 já se dizia que o mundo estava ficando sem comida, mas hoje a obesidade se tornou um problema de saúde pública. Nos anos de 1980 foi a vez de divulgar o apocalipse nuclear. Na década de 1990 a camada de ozônio estava sendo destruída. Nos anos 2000 em diante o aquecimento global e a elevação dos oceanos ameaçavam a humanidade. Agora a expressão “aquecimento global” já foi substituída pelo termo “mudanças climáticas”, pois não há como errar, já que o clima está sempre mudando desde a formação do planeta. E agora no presente, qual é o pânico? E no futuro? Notem que, quando uma determinada narrativa de pânico perde credibilidade ela desaparece misteriosamente dos noticiários e outra assume o protagonismo. Muda-se as narrativas e as pessoas não percebem, pois as notícias são cuidadosamente manipuladas porque poucos controlam as informações. Cala-se indivíduos racionais e cria-se o pensamento das multidões. O pensamento das multidões é o pensamento de uma classe dirigente que o homem comum das multidões desconhece.     

Liberdade econômica X controle social

Conforme já mencionado, Antonio Gramsci constatou que a industrialização na Europa estava promovendo a ascensão social e isto não motivaria o proletariado a pegar em armas para destruir os burgueses. De fato, nos países com industrialização mais avançada, não seria possível uma revolução socialista igual a que aconteceu na Rússia (1917).

Ora, se o próprio Gramsci reconheceu uma situação em que o capitalismo tinha ingressado numa fase distributivista, por que o desejo de destruir uma estrutura socioeconômica que dava sinais claros de avanços sociais? Boa pergunta. Seria a busca pelo poder econômico e político? Ou ele achava que poderia acelerar o processo de distribuição de riqueza criticando duramente o modo de produção capitalista? Ou simplesmente tratava-se de uma obsessão de moldar comportamentos? Ou tudo junto?

O termo “aburguesamento do proletariado” passou a ser tratado como pejorativo. O desejo de o operário em possuir bens de consumo tem sido propagandeado como o desejo de um oprimido em se tornar um opressor. O desejo de alguém alienado que não quer destruir o patrão e acabar com a sociedade de classes. Mas, o que realmente deseja o trabalhador? Deseja ter uma renda digna. E isto não implica em destruir o sistema que, apesar dos defeitos, é o único que pode possibilitar a ascensão social. Sistema que merece aperfeiçoamento para não deixar que os monopólios prevaleçam e nem deixar que pessoas desafortunadas passem privações materiais.  

Nenhum outro sistema socioeconômico já experimentado chegou tão longe em termos de progresso humano e conforto material, e isto é uma constatação óbvia negada em inúmeras salas de aula. Fala-se mal do capitalismo como se antes deste modelo econômico o mundo fosse melhor do que hoje. É óbvio que as mudanças não acontecem em todos os espaços ao mesmo tempo. É por isso que o padrão de vida na Noruega ou na Dinamarca é um contraste exorbitante em relação a países como Etiópia ou Somália. É a pobreza que deve ser combatida e não a riqueza.

A liberdade econômica e o desenvolvimento das tecnologias foram as grandes responsáveis pelas mudanças de costumes na sociedade e não as revoluções sociais. Só para ilustrar com apenas um exemplo sem sair de casa, ninguém se liberta dos afazeres domésticos sem a máquina de lavar, sem o aspirador de pó, sem o fogão a gás ou elétrico, sem a geladeira e o freezer, sem a air fryer e por aí vai. E essa liberdade de tempo e locomoção já pulou o muro das residências com o iFood e o Uber. Inclusive os progressistas não abrem mão destas plataformas, embora sejam críticos veementes. No entanto, a cada tecnologia que impacta milhões de pessoas logo se inventa um termo pejorativo. E a luta continua…

No auge da guerra fria (década de 1960) era evidente que a atrasada estrutura econômica dos países da América Latina, com economias basicamente voltadas para exportação de produtos primários, impedia que essas nações desenvolvesse uma sociedade de consumo de massa, modelo que iniciou o aburguesamento das classes mais baixas nos chamados países ocidentais (EUA e parte da Europa). Tal situação de capitalismo mais exploratório do que distributivista animou os marxistas clássicos a estimular a chamada luta de classes.

Superada a década de 1970 e com a modernização das atividades econômicas, ainda que lenta nos países da América Latina, notou-se que a ideia de uma sociedade sem classes e a extinção da propriedade privada estava muito distante de acontecer, pois o possível “soldado” da revolução foi descartado pelo salário do soldador da indústria. Desde a década de 1970 já era perceptível no Brasil o nascimento de uma nova classe média a partir das indústrias, sobretudo no âmbito da cadeia produtiva automobilística.

Ao longo das décadas de 1980 e 1990 as famosas greves no setor industrial pouco a pouco sucumbiam diante de novas tecnologias que diminuíram sensivelmente o exército de trabalhadores da indústria, pulverizando-os para outras atividades econômicas no setor da prestação de serviços. Onde há mais desenvolvimento da tecnologia, há menos greve ou nenhuma.

A dicotomia capital X trabalho e a convivência com os movimentos grevistas não se dava apenas no setor industrial. Também se operava no setor bancário. O advento da internet e principalmente com as facilidades nas transações financeiras diminuiu sensivelmente o exército de trabalhadores neste setor e, consequentemente, os sindicatos perderam poder porque o dinheiro agora circula virtualmente. Os sindicatos, necessários para o equilíbrio de forças, precisam reinventar-se; precisam assumir o papel para o qual eles foram concebidos lá nos primórdios do capitalismo industrial. Precisam abandonar a órbita de partidos políticos que condenam quem prospera economicamente.

Ainda nesta toada dos movimentos grevistas, a única classe ainda totalmente aprisionada às tradicionais greves é a dos professores de instituições públicas de ensino básico. Até quando? A pandemia da Covid 19 poderia ser um divisor de águas? Nada impede que os governos daqui em diante façam uso de plataformas de ensino para oferecerem conteúdos em caso de greve. O ano letivo não será interrompido e tampouco haverá reposição de aulas. O que fazer quando a greve não serve mais para obter ganhos? Quando serve apenas para satisfazer demandas político-partidárias?

Aliás, é triste constatar, mas quem sente o impacto de greve dos professores? Até muitos alunos gostam, mesmo sendo as vítimas. O impacto se prolonga ao longo dos anos, dilui-se no tempo e os governos não estão preocupados com o futuro que, em tese, não os atinge e nem aos seus filhos e netos.

Mas, até que ponto, os movimentos grevistas no âmbito do magistério público básico (estados e municípios) poderiam render salários mais elevados? Se greve de professor rendesse bons salários, certamente seria a classe com melhor remuneração no serviço público. Mas, afinal, para que servem as greves no magistério público? Mais adiante, no próximo item, ousarei responder, a despeito de possíveis acusações de teórico da conspiração.

Quando as massas salariais são elevadas e o desemprego sucumbe a números aceitáveis, definitivamente fracassam os processos revolucionários que buscam o controle social para impor um mundo ideal. Explicando: toda revolução permanente, cujos fundamentos é o marxismo, só consegue sobreviver com a existência de uma classe permanentemente pobre. E a perpetuidade da pobreza depende de os governos manterem volumosa população dependendo do assistencialismo estatal. Basta uma geração de dependentes do Estado para o ciclo se repetir indefinidamente.

Quando o contingente de necessitados a ser atendido pelo poder público for demasiadamente numeroso, fica mais fácil criar uma constante instabilidade social que passa a ser usada como instrumento revolucionário. Os oportunistas dizem ao homem comum que a pobreza e o desemprego de muitos são causados pela culpa dos capitalistas. Esses oportunistas e milhões de pessoas comuns adoram futebol e cinema, colaborando para o enriquecimento de jogadores e artistas. Seriam as celebridades também culpadas pela pobreza dos outros? 

Somente os problemas de natureza econômica, como o desemprego, não têm sido suficientes para arrebanharem adeptos apoiadores de um Estado todo poderoso. É preciso explorar todas as possibilidades com potencial para gerar conflitos. Gerar discussões infindáveis sobre tudo que possa dividir a sociedade até que as mentalidades estejam receptivas para delegar ao Estado o controle social sem que as pessoas percebam. Nunca houve interesse dos revolucionários a ampliação das liberdades, mas sim pelo controle. Liberdade econômica não combina com o controle estatal.

Salários baixos dos professores de ensino básico: seria um importante ativo ideológico?

Não existe melhor vacina contra qualquer tipo de ideologia de matriz marxista do que salários dignos. Foi por isso que a esquerda (os progressistas) perdeu a luta de classes sob a ótica burgueses X proletários. Quando Henry Ford (1863-1947) dobrou o salário de seus empregados e diminuiu a jornada de trabalho, ele não foi motivado por pressão sindical ou por algum movimento grevista, mas sim para manter em sua empresa os melhores e evitar a rotatividade de trabalhadores na intenção de ganhar dos concorrentes.

É fato que uma grande parte do corpo docente se identifica como pertencente à classe pobre ou média baixa. Tudo a pretexto de ostentar uma bandeira revolucionária que se apresenta como a salvação dos pobres e oprimidos. Diferentemente de outros profissionais de origem pobre, mas que ascenderam socialmente, percebe-se claramente na atualidade que há uma expressiva parte de professores que, mesmo após formados em nível superior, não detectam ascensão social em suas vidas. Continuam sentindo-se na mesma classe social de onde se originaram ou se identificam como oprimidos. É por isso que no âmbito da escola pública muitos professores fazem o discurso de identificação com as origens dos alunos das classes pobres. Talvez de forma inconsciente, não querem ser vistos como membro de uma tal classe opressora. Ainda insinuam que os alunos são pobres porque o capitalismo torna o rico cada vez mais rico e o pobre cada vez mais pobre.

Já muitos docentes que atuam em escolas particulares das classes altas, (não raro os mesmos que atuam nas escolas públicas), como não têm a clientela pobre para externalizarem suas angústias em busca de uma sociedade igualitária, enxergam os pais de seus alunos como opressores capitalistas e não como pagadores de seus salários. Para muitos alunos das classes altas a mensagem ilusória de uma tal igualdade absoluta até pode ser eficaz, a despeito de, geralmente, acabarem ocupando os cargos mais elevados da Administração Pública e da iniciativa privada. Em regra, serão os legisladores, os ministros, os secretários de estado, os juízes, os promotores, os diretores de grandes empresas etc., ou seja, farão parte da cúpula da administração pública e privada e tomarão decisões importantes no futuro.

Voltando para o âmbito da escola pública… considerando a inviabilidade de transformar o operário em soldado da revolução, imagino (uma teoria) que a grande sacada dos adeptos do novo marxismo (ou neomarxismo) no âmbito dos países pobres, sobretudo da América Latina, tenha sido a transformação dos professores em agentes disseminadores de um tal processo revolucionário sempre de matriz marxista. É por esta razão que muitos se consideram, primeiramente, formadores de cidadãos. Apenas secundariamente estariam formando os futuros engenheiros, economistas, advogados, mecânicos, empreendedores ou qualquer outro tipo de profissional capaz de viver de seus próprios ofícios. Erroneamente eles acham que o exercício da cidadania é pré-requisito para uma boa formação profissional e não o contrário.

Quem está em condições de receber e não recebe o devido preparo para ganhar renda digna com o próprio trabalho terá uma cidadania de papel, pois será um eterno dependente do assistencialismo. Infelizmente tal preparo é negligenciado a muitos jovens das escolas públicas desde a alfabetização. Obviamente que não me refiro àqueles desafortunados ou pessoas com necessidades específicas que precisam do auxílio estatal para sobreviverem. Mas não podemos transformar essas exceções em contingentes tão volumosos a ponto de se perder a característica da exceção.

É uma boa estratégia cultivar uma mentalidade anticapitalista no docente. É necessário que ele se sinta integrante de uma classe baixa ordinariamente explorada pelos burgueses. E com salários baixos fica mais fácil o docente sentir-se pertencente à classe dos oprimidos. Quem não se sente oprimido não terá razão para lutar contra o opressor.

Em virtude dos baixos salários (ainda que superiores a muitas categorias profissionais), inúmeros professores egressos das classes pobres não enxergam o fato de terem obtido significativas mudanças econômicas em relação às gerações de seus pais e avós. E ainda se sentem injustiçados em relação a muitas pessoas que tiveram as mesmas origens e nem precisaram estudar tanto para isto, mas têm rendimentos muito superiores. E quem é o culpado disso tudo? A resposta padrão é que o capitalismo que não valoriza a educação. Talvez muitos tenham inveja (embora não reconheçam) de um empreendedor que, sem muito estudo, montou um negócio (uma padaria, um restaurante, por exemplo) e acumulou riquezas. Creio, salvo engano, que uma parte considerável de professores não entende a dinâmica da economia de mercado. O mercado não necessariamente recompensa os méritos, mas sim, os resultados. É por isso que ignorantes fazem sucesso no YouTube opinando sobre tudo que não conhecem para um público gigantesco que nada sabe. O mercado funciona sob demanda e não sob controle.

O que de fato interessa às pessoas num dado momento? Os interesses subjetivos, bem como as necessidades mais urgentes das pessoas têm forte presença na valoração de um produto. Um copo d’água e um pãozinho no deserto valem mais do que um diamante, pois a necessidade é preponderante. O público interessado em assistir um show no Rock in Rio dificilmente gastaria R$ 500,00 na compra de livros se tivesse que escolher entre um e outro produto, pois o desejo imediato vence possíveis oportunidades no futuro. Há mais pessoas interessadas em assistirem futilidades no YouTube do que curtirem aulas de matemática ou língua portuguesa.

São as escolhas, as preferências, os desejos e as necessidades das pessoas que determinam o que elas comprarão conforme suas respectivas rendas. Os empreendedores que acertam na identificação das demandas das pessoas e oferecem o produto obtêm lucro, mas os que erram não são lembrados como opressores.

A qualidade do produto, a sua importância, o preço, o tempo que se levou para produzi-lo não são necessariamente os definidores do seu valor. É a subjetividade, a necessidade e o momento da compra que determinam o valor das coisas e o que será consumido conforme a renda de cada indivíduo. Essas obviedades parecem coisas criptografadas nas licenciaturas. Manter as criptografias é uma forma de engenharia social para a instrumentalização da classe dos professores.

É muito simplista chamar as pessoas de alienadas porque não escolheram o que deseja o iluminado revolucionário da academia. Liberdade de escolher o certo e o errado deve prevalecer após exame de um leque de opções, desde que tal leque exista. Quando as escolhas têm repercussão apenas no contexto individual, cada qual deve assumir os erros de suas escolhas. Mas quando há escolhas de natureza coletiva o erro acaba prejudicando a todos quando se escolhe um modelo de Estado que determinará doutrinariamente o que é certo ou errado.

Diante do exposto, o problema salarial dos professores é crucial para a instrumentalização da classe. É uma forma de manter sempre viva as ideologias totalitárias, do pensamento único, que não suportam as diferenças e vulgarizam a palavra “democracia”. É da natureza humana rever seus conceitos quando as pessoas são colocadas diante de uma situação economicamente melhor. Depois que se experimenta os prazeres de uma vida confortável, com uma renda suficiente para consumir os bens da modernidade, quem vai querer pregar a substituição de um modelo econômico que permite ascensão social? Entretanto, ainda que irônico, muitos artistas e escritores ganham dinheiro pregando a extinção do próprio modelo econômico que os remuneram regiamente. Ou será que é mais um truque de marketing?

Como parar o ciclo reprodutivo nas narrativas neomarxistas?

Quando se olha para os cursos de licenciaturas, o que vemos? São os menos concorridos. Basta perguntar num desses cursos preparatórios quem pretende fazer licenciatura: pouquíssimos. Por quê? Resposta: salário baixo e indisciplina dos alunos. A mesma pergunta também pode ser feita aos alunos do terceiro ano do ensino médio das escolas públicas. Até o aluno indisciplinado fala exatamente isto. E muitas escolhas acabam recaindo na segunda opção por insuficiência de pontos para a primeira.

Numa sociedade onde professores do ensino básico são bem remunerados e prestigiados, os discursos ideológicos que pregam um Estado controlador seriam vistos apenas como o natural exercício da liberdade de expressão, sem afetar a vida econômica e cultural da nação. Entretanto, quando a massa de estudantes é atingida nos ensinos fundamental e médio por intensa pregação ideológica, esses jovens naturalmente mais suscetíveis ao ilusório mundo da igualdade absoluta saem prontos para receberem o aperfeiçoamento, sobretudo nos cursos de licenciaturas que formarão novos professores para darem continuidade ao processo. Essa geração mais adiante irá apoiar e eleger políticos que defenderão mais regulamentação estatal.

A única forma de tornar o neomarxismo apenas uma doutrina inexpressiva é apagar a mentalidade anticapitalista, portanto, antimercado da classe dos docentes. E o modo mais rápido de se fazer isto não é pela via da educação ou por uma reforma do ensino, mas sim pela via salarial. Bastará uma geração para que os cursos de licenciaturas sejam tão atrativos para que os egressos não queiram exterminar os geradores de riquezas responsáveis pelos seus salários. Os profissionais do jornalismo, de relações públicas, do entretenimento, dentre outros formadores de opinião, deixarão de reproduzir incentivos à luta de classes nos moldes culturais, pois terão passado pelas mãos de uma classe bem remunerada. O elo certo da corrente que deve ser quebrado está na figura do professor do ensino básico. É ele que formará o recurso humano da universidade que irá teorizar sobre experimentos sociais a pretexto de transformar o mundo. É ele que formará os tomadores de decisões na política e nos grandes veículos de mídias.

Professor mal remunerado é uma porta sempre aberta aos riscos de regimes totalitários, não iguais àqueles do século XX, mas outros com rótulos culturais e embalagens aveludadas, mas cujo objetivo é o mesmo daqueles regimes de outrora: controle total da sociedade agora pelas vias do consentimento tácito. Estamos a caminho da formação de uma geração do pensamento único que falará sobre pluralidade de ideias? Quando vejo professores falando de pluralidade de ideias, mas não admitem o compartilhamento de outras ideias, então significa que não se sabe mais o que é de fato pluralidade de ideias.  

E quanto aos professores de universidades públicas que têm melhores remunerações e possuem agendas progressistas? Como explicar? Inicialmente eles foram os primeiros a serem seduzidos por uma suposta justiça social e formaram as novas gerações de professores do ensino básico. Concluída esta etapa, as gerações posteriores de docentes do ensino superior passaram a receber revelações dos professores de ensino básico. Só após um longo tempo de salários elevados de professores da educação básica será possível obter mudanças. Entretanto, vejo um complicador: sendo autoridade do ensino superior e dono do território acadêmico, o professor doutor é seduzido a se autolegitimar a dizer o que é certo ou errado e não admite questionamentos. Repete utopias que aperfeiçoou nas pós-graduações. Acredita que tudo não passa de uma luta de classes onde quer que haja um conflito. É um agente propagador do neomarxismo que vive do salário pago pelos impostos de quem gera riquezas.

Conclusão

A grande sacada está no ensino básico, a espinha dorsal do processo, fase em que os profissionais do ensino podem trabalhar com as emoções de seus alunos. E têm mais sucesso com as classes de maior poder aquisitivo do que com as classes pobres. Até porque quem sempre organizou os processos revolucionários tem sido a tal burguesia tão “odiada” por muitos que fazem parte dela própria. 

O docente é o profissional comum em todas as profissões. Todos são obrigados a passarem por uma escola. Do empreendedor de sucesso ao garoto que foi seduzido pelo crime e pelas drogas. Não seria impróprio dizer que, em grande medida, a sociedade é o reflexo de seus professores. Se eles acreditam mais em utopias do que nas realidades, então significa que são usados mais como soldados de um grande sistema que aparenta buscar uma suposta justiça social. Não percebem o jogo porque são peças do próprio jogo e não jogadores.

Quando um profissional bem sucedido no mundo artístico ganha, por exemplo, quinhentos mil reais por mês e coloca a culpa pela desigualdade social no sistema econômico que o remunera regiamente, este profissional é a própria contradição em pessoa. Talvez seja reflexo de seus professores por pensar desta maneira. Em outros termos, num comportamento explícito de dissonância cognitiva, o artista que lucra com o sistema de economia de mercado é o mesmo que condena esta forma de organização socioeconômica. Tem dificuldade ou não quer perceber que sua remuneração é fruto do consumidor dos produtos de seus patrocinadores, ou seja, seus ganhos, que são reais para ele próprio, mas utópicos para os homens comuns, é fruto do retorno que ele dá aos patrocinadores. O patrocinador, necessariamente, não está preocupado com a qualidade, mas com o retorno. É assim que funciona o mundo real.

Embora a questão salarial seja importante para desacreditar modelos econômicos que nunca deram certo, por que existe tanta gente bem remunerada que atua como ativista ideológico? Por que tantos milionários do entretenimento agem explicitamente como ativistas das chamadas agendas progressistas? Por que esses milionários defendem agendas políticas claramente contrárias à propriedade privada e à liberdade de expressão? E por que criticam o próprio sistema que tanto os beneficiam?

Porque gera mais audiência, mais visibilidade e, consequentemente, mais ganhos para os patrocinadores. Além disso, os milionários não acreditam que perderão suas propriedades porque são eles que controlam os movimentos sociais que lutam contra propriedade privada. Tudo faz parte de um jogo que o homem comum e manipulado não compreende. Os agentes do grande capital também ganham mais dinheiro fomentando pânico e críticas acirradas ao próprio modelo econômico que mais possibilitou a ascensão social. Tudo vira mercado e tudo pode ser instrumentalizado para manter o jogo, inclusive o pânico seguido da venda da solução para o problema. Artistas, jornalistas e escritores bem sucedidos ao lado de mortais professores são apenas instrumentos sofisticados para disseminar as chamadas agendas progressistas que pregam a utopia de um mundo ideal. Ideal para quem? Para os bilionários que financiam os movimentos sociais que pregam igualdade de classes? 

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